A Agência que ainda não conseguiu exercer o seu papel

Substituir um questionável e antigo DNPM por uma agência moderna, técnica e autônoma representava uma mudança institucional e a expectativa de uma regulação estável, eficiente e blindada contra interferências políticas. São passados quase sete anos e isto não se concretizou.
Na semana passada, tomamos conhecimento de correspondência da Agência Nacional de Mineração (ANM) a vários ministros alertando que a não liberação de recursos compromissados pelo governo poderia levar a Agência ter que paralisar as sua principais atividades.
O setor de mineração sempre defendeu uma Agência forte e a sociedade passou a acompanhar mais a sua importância após as tragédias das barragens em Mariana e Brumadinho.
A criação da ANM, em 2017, substituindo o DNPM, foi saudada como um marco na gestão pública do setor mineral. Substituir um questionável e antigo DNPM por uma agência moderna, técnica e autônoma representava uma mudança institucional e a expectativa de uma regulação estável, eficiente e blindada contra interferências políticas. São passados quase sete anos e isto não se concretizou. Ela nasceu com grandes responsabilidades, dentre as quais destaco: fiscalizar atividades operacionais existentes e respectiva arrecadação da CFEM (Contribuição Financeira pela Exploração de recursos Minerais), autorizar novas pesquisas e, no seu conjunto, proteger a sociedade dos efeitos da mineração sobre ela.
Para isto, a Lei da sua criação estabelecia que 7% dos valores arrecadados da CFEM seriam a ela direcionadas. Para se ter uma ideia, o valor de recolhimento desta Contribuição, de 2017 a 2024, foi de cerca de R$ 44 bilhões. Nos dois últimos, a cada ano o valor foi superior a R$ 7 bilhões anuais. Isto significa que deveriam ser atribuidos à Agência aproxidamente em torno de R$ 440 milhões anualmente.
Estes recursos seriam suficientes para os objetivos da sua criação fossem colocados em prática. Infelizmente não é isto que vem acontecendo. Os valores são recolhidos para o caixa único do Governo e estima-se que em torno de 60% são contingenciados. Mesmo assim, tendo como exemplo o que foi mencionado na correspondência da semana passada, existe uma queda de braços para liberação mesmo daquilo que não foi contigenciado.
O Tribunal de Contas da União vem alertando, há anos, este descompasso, em sucessivos relatórios e alerta que esta situação inviabiliza o cumprimento do papel que caberia à Agência, inibindo a adequada fiscalização de barragens, a regulação dos títulos minerários e até a arrecadação que sustenta o próprio sistema. E vai mais longe, ao destacar que existe uma falha de financiamento e governança, o que ameaça a segurança e credibilidade do setor.
É importante destacar que, no momento em que o mundo debate a necessidade do desenvolvimento dos chamados minerais críticos e também de terras raras, o Brasil se posiciona como um potencial ator neste cenário e finalmente considera a importância do setor mineral para o seu desenvolvimento econômico e social.
Mas todos sabemos quão longe estamos da realidade. Acreditamos que temos reservas para atender às novas demandas do mercado, mas nos faltam pesquisas e solução de problemas estruturais que nos permitam agregação de valor aos minerais atualmente em operação ou aqueles que venham a ser viabilizados. Mais do que nunca vale o alerta: precisamos de uma ANM forte, que ajude o Brasil a se fortalecer neste segmento da economia.
A situação se torna mais crítica quando voltamos ao tema do que aconteceu em Minas Gerais, algumas semanas atrás, quando um dos diretores Agência foi denunciado por estar envolvido num esquema de corrupção.
Isto deve ser um alerta para que não só a ANM, mas todas as Agências Regulatórias no Brasil, tenham indicações respaldadas pela efetiva comprovação de capacidade técnica e idoneidade.
Sem observar os pontos aqui abordados, o Brasil vai continuar vivendo um paradoxo: cria instituições modernas no papel, mas não lhe dá meios e liberdade para funcionar. (Por Wilson Brumer -- Conselheiro da Revista Brasil Mineral, foi Presidente Executivo da Vale, Acesita (hoje Aperam) e Usiminas e Presidente dos Conselhos do IBRAM e da BHP Billiton no Brasil).
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