
Por Giancarlo Silva – CEO da Ígnea Geologia e Meio Ambiente e Daniel Vieira - Consultor
A gestão e o aproveitamento do potencial mineral brasileiro estão entre as principais atribuições da Agência Nacional de Mineração (ANM). Desde sua criação, no entanto, a Agência Nacional de Mineração (ANM), vem lutando para se estruturar adequadamente para cumprir suas funções institucionais e gerir o patrimônio mineral de um país complexo e de dimensões continentais como o Brasil. O recém-lançado painel “Distribuição da Mineração no Brasil[1]” proporciona um retrato que permite quantificar o impacto da falta de estruturação da Agência.
Uma primeira informação que chama a atenção é a distribuição dos processos minerários no tempo. Desde 2012, no mínimo 10 mil novos processos sobre direitos minerários são abertos por ano. Nos últimos 10 anos, mais de 150 mil novos processos sobre direitos minerários foram abertos (cerca de 60% dos processos existentes) na ANM. Por um lado, tais números evidenciam o interesse privado e os investimentos que o setor mineral atrai. Por outro, todos esses processos demandam análises técnicas, fiscalizações e acompanhamento das informações prestadas. Se em 2017, quando da sua criação, a Agência já tinha um déficit de servidores, conclui-se que o quadro vem se tornando cada vez mais crítico, senão insustentável.
O próprio painel também traz indícios sobre as consequências da falta de estruturação. A Agência conta atualmente com 8.426 áreas que aguardam a realização dos procedimentos de disponibilidade para serem colocadas à disposição da iniciativa privada. Para além dessas áreas, encontram-se pendentes de análise na ANM 23 mil requerimentos de pesquisa, 21 mil requerimentos de lavra, 18 mil requerimentos de lavra garimpeira e 9 mil requerimentos de licenciamento. Juntos, esses mais de 81 requerimentos e 8 mil áreas aptas para disponibilidade perfazem uma área total de 71,7 milhões de hectares. Uma área equivalente à dos estados da Bahia e do Ceará, que atrai o interesse da iniciativa privada e que poderia estar recebendo investimentos produtivos, estimulando a atividade econômica e gerando empregos.
Outro número que chama a atenção é a quantidade de processos em fase de autorização de pesquisa. São mais de 102 mil processos em fase de autorização de pesquisa. A pesquisa mineral constitui uma etapa extremamente relevante do desenvolvimento de um empreendimento mineral, uma vez que é nela que serão realizados trabalhos para a identificação e o dimensionamento de um jazimento mineral, assim como para definição da melhor técnica para o seu aproveitamento econômico. Trata-se de uma etapa intensiva em investimento (levantamentos de campo iniciais de uma pesquisa mineral custam no mínimo em torno de R$ 350 mil, podendo tal valor crescer exponencialmente e ultrapassar a casa dos milhões, de acordo com a substância pesquisada, realização de campanhas de sondagem, análises laboratoriais e estudos complementares) e de alto risco (não há qualquer garantia de que o jazimento pesquisado se mostrará viável para exploração econômica). Junte-se a este contexto dificuldades de acesso às áreas para realização dos trabalhos e morosidade e dificuldade para obtenção de licenças ambientais e outras autorizações.
Em que pese os investimentos e o risco da iniciativa privada, um percentual significativo de processos na fase de autorização de pesquisa aguarda análises e decisões da ANM. 17,9% dos processos que constam como em fase de autorização de pesquisa já contam com o Relatório Final de Pesquisa apresentado. São áreas que demandam um posicionamento da Agência quanto aos trabalhos realizados para ou pedir complementação das informações ou, no caso de aprovação, avançar para a etapa de concessão de lavra e proporcionar o início das atividades produtivas.
Outros 14,96% dos processos na fase de autorização de pesquisa já têm seu Relatório Final de Pesquisa apresentado, demonstrando a inexistência de jazida, ou inseridos em casos em que a Agência entende que os trabalhos realizados foram insuficientes ou apresentaram deficiências técnicas em sua elaboração. No caso de relatório indicando a inexistência de jazida, as áreas poderiam ser imediatamente encaminhadas para disponibilidade ou consideradas áreas livres para novos interessados. Para os processos com informações insuficientes ou deficiências técnicas, a ANM pode formular exigências a serem cumpridas em até 60 dias (prorrogáveis por mais 60 dias). Encerrado o prazo sem o adequado cumprimento das exigências, a ANM deverá negar aprovação ao relatório final e declarar a área disponível. Há ainda cerca de 8.800 processos, (8,59%) de áreas renunciadas pelos titulares de autorização de pesquisa que aguardam avaliação da ANM para se tornarem áreas livres. As áreas com relatórios de pesquisa positivos ou negativos apresentados e áreas renunciadas perfazem o total de 44,9 milhões de hectares.
A falta de pessoal na ANM faz com que mesmo processos simples demandem um prazo extraordinário para serem analisados, resultando no acúmulo de processos e à não liberação de áreas para serem requisitadas para novos projetos de pesquisa mineral. Áreas paradas na ANM não geram investimentos. Pelo contrário, as áreas presas na burocracia podem representar perda de oportunidades. Não se trata aqui de argumentar que a Agência deva atuar de forma açodada ou abrir mão do rigor técnico de suas análises processuais, mas de reconhecer que a falta de estruturação da ANM é hoje um gargalo estratégico que afeta diretamente o desenvolvimento da mineração nacional.
Fonte: dados tratados pela Ígnea Geologia e Meio Ambiente a partir de coleta nos dados abertos da ANM[1].
[1] Disponível em: https://app.anm.gov.br/dadosabertos/SCM/microdados/ acesso em abril de 2025.
[1] Disponível em: https://www.gov.br/anm/pt-br/assuntos/noticias/anm-lanca-painel-sobre-distribuicao-da-mineracao-no-brasil, acesso em abril de 2025.
[2] Disponível em: https://app.anm.gov.br/dadosabertos/SCM/microdados/ acesso em abril de 2025.
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