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10º MINERAÇÃO &/X COMUNIDADES

O papel da igreja como promotor de diálogo com as comunidades

Por evando
O papel da igreja como promotor de diálogo com as comunidades

Na parte da tarde aconteceu o Painel ‘Diálogo Corajoso - a atuação das igrejas em relação à mineração’ com a participação da Bispa Marinez Bassotto, da Diocese Anglicana da Amazônia, Bispa Primaz da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, Monica Santos, da Comissão dos Atingidos pela Barragem de Fundão e a Pastora Romi Bencke, Secretária Geral - CONIC (Conselho Nacional das Igrejas Cristãs no Brasil). O painel teve a mediação de Rolf Fuchs, presidente da Integratio.

Fotos: Leo Fontes

A Bispa Marinez disse que a temática é desafiadora e que começou no Reino com as igrejas Anglicana e Metodista, com um movimento chamado de Iniciativa de Reflexão sobre Mineração e Fé, evento que acontece no mês de outubro e que reúne representantes das mineradoras e igrejas baseadas na fé. Esse movimento fortaleceu a iniciativa Diálogos Corajosos, que acontece na África do Sul há mais de uma década e tem como objetivo promover debates entre CEO’s de mineradoras, as principais igrejas locais e outros atores sociais, como pessoas impactadas pela atividade mineral.

Na África do Sul houve uma desconfiança inicial de ambas as partes e atualmente a adesão é muito grande, com participação de governo e inúmeros avanços. “É um espaço de escuta para uma conversa aberta e a igreja tem como papel a mediação junto aos territórios, uma vez que existe uma confiança. Além disso, igrejas compreendem o meio ambiente (criação de Deus) e têm um maior cuidado no debate de impacto ambiental e social”. A partir de um incentivo desse grupo, conseguimos reunir todas as partes em outubro de 2024, em Belo Horizonte, onde estiveram presentes quatro mineradoras e diversas igrejas das mais variadas vertentes. A conclusão final dessa reunião é que os Diálogos Corajosos precisam ser realizados no Brasil, com uma participação maior da mineração. Ficou definido um Comitê permanente com entes das pessoas atingidas, das igrejas e de mineradoras e todos entendem que é necessário ouvir os membros que atuam nos territórios. “Não é um diálogo com intermediários, mas um diálogo direto”. Sobre como o diálogo pode render fatores positivos? “Primeiramente é necessário quebrar esse sentimento que se tem de que não se é escutado. As pessoas não se sentem acolhidas pelas mineradoras e o primeiro ponto é desmanchar essa barreira, para que possamos avançar de forma honesta. Temos que criar relações entre as pessoas para construir transformações, mas não é algo fácil”.

Já a Pastora Romi Bencke, Secretária Geral - CONIC (Conselho Nacional das Igrejas Cristãs no Brasil), disse que o movimento ecumênico moderno surge pelas consequências provocadas pela Segunda Guerra e em defesa dos diretos humanos, sociais, econômicos, ambientais e culturais. “O CONIC se envolve por meio de uma das igrejas (Episcopal) que é uma das proponentes dos Diálogos Corajosos. “Para a totalidade das ações religiosas, a natureza é sagrada, por ser a expressão da graça de Deus. Para os indígenas, a natureza é sagrada, assim como em outras tradições. Para todas, a ideia da comunidade é central e quando uma mineradora define explorar algum minério em um território ocupado, as pessoas já vivem suas histórias e sua experiência com Deus. Em Mariana, houve uma igreja destruída que é muito mais que um templo, mas uma história coletiva presente em um espaço sagrado. No passado, no Movimento de Pessoas Atingidas por Barragens no Sul, a igreja se envolveu pelo fato das pessoas atingidas serem nossas conhecidas através de batizados, casamentos, velórios. O Diálogos Corajosos nos coloca o desafio de refletir em conceitos da criação, da integridade, relacionada com paz e Justiça. Precisamos da integridade dos territórios, comunidades e entender que as empresas querem o lucro, mas muitas vezes isso gera conflito e precisamos encontrar métodos para debater o melhor para cada parte envolvida, independente da fé de cada um.

“A fala da Monica mostrou que diálogos podem não gerar resultados e ele fica oco quando ninguém cede e partimos de relações de poder em desigualdade. As comunidades são as partes mais frágeis e é preciso buscar uma igualdade entre todos”. Uma flexibilização é necessária para derrubar esses muros que foram erguidos. Outro ponto são as regras e as leis, como é o caso da licença ambiental. Caso a Convenção OIT 169 fosse aplicada como realmente ela prevê, muitos dos conflitos poderiam ser evitados, pois os acordos seriam feitos antes. E, por último, preservar a confiança como valor em si mesmo”.

Por último, Monica Santos, da Comissão dos Atingidos pela Barragem de Fundão, explica que “as pastoras entenderam o significado da nossa terra e podemos contar com elas. Em relação à mineração, antes do acidente os funcionários da Samarco tinham uma boa relação com a comunidade. Com a tragédia, a confiança foi perdida e passamos a conhecer um outro lado para lutar pelos nossos direitos. Apesar do contato tenso, o diálogo com as empresas depois do crime é necessário, mas tenho dúvidas se os executivos das mineradoras têm o mesmo interesse, pois estão se esquivando dos diálogos. As empresas querem mudar o jeito de agir, entrar e destruir e não precisamos essa mineração predatória”.

Uma vez que a comunidade de Bento Gonçalves não tem mais uma água de qualidade, isso impacta toda uma cadeia e estamos falando de dois acidentes que são de responsabilidades das três mineradoras e não de Mariana e Brumadinho. Uma votação no Senado modificou a forma de se emitir uma licença e precisamos conversar com essas pessoas. Para concluir, Monica disse que o caminho é difícil, mas diz que as mineradoras precisam ceder, uma vez que as comunidades não têm mais do que abrir mão. Falta empatia e as empresas precisam se colocar no lugar dos territórios. Vamos insistir até que ela aconteça”.

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