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BRASIL MINERAL ENTREVISTA

Com vetos ou sem vetos, nova lei pouco muda no licenciamento ambiental no País

Por evando
Com vetos ou sem vetos, nova lei pouco muda no licenciamento ambiental no País

Com ou sem vetos, a lei geral do licenciamento ambiental, sancionada no dia 8 de agosto de 2025, pelo presidente da República, praticamente mantém o modelo de licenciamento ambiental adotado no País, ainda na essência baseado na resolução 237 do Conama (Conselho Nacional de Meio Ambiente). É o que opina a secretária de Meio Ambiente do estado de Goiás, Andrea Vulcanis, que tem um vasto histórico de atuação no setor antes de ocupar o cargo que exerce atualmente em Goiás, tendo sido uma das mentoras da LAC (Licença por Adesão e Compromisso) adotada pioneiramente no estado da Bahia, em 2012, para empreendimentos de baixo e médio potencial poluidor e posteriormente proposta por ela para o estado de Goiás.

Para Vulcanis, a LAC é a única novidade (mas não uma inovação) na lei aprovada recentemente pelo governo federal. “A lei inova com a licença corretiva, que não tinha na legislação, e cria a LAE (Licença Ambiental Especial) para projetos que o governo federal definir que devem ser prioritários. Mas questiono se isto é realmente uma inovação, porque o governo já pode dizer o que é prioritário e licenciar de forma prioritária. O que parece uma inovação, na verdade não é”. O que a lei traz de importante, segundo a secretária, é a licença monofásica e não mais por etapas.

Ela critica o veto presidencial que retirou dos estados a possibilidade de elaborar os seus modelos próprios de licenciamento, principalmente porque isso representa um retrocesso para estados como Goiás, que havia já introduzido mudanças na sistemática de licenciamento ambiental, inclusive com a proposição da LAC para empreendimentos de baixo impacto poluidor. “Como ficam esses estados?”, questiona Vulcanis. Embora os vetos presidenciais tenham mantido a LAC, ficam de fora empreendimentos de médio impacto poluidor.

A secretária fala com a experiência de quem atua há quase três décadas na área ambiental e acompanhou de perto – primeiramente no Ibama e depois em órgãos estaduais de meio ambiente – todo o embate relativo à adoção das políticas ambientais no País. Com base nessa experiência, ela diagnostica que o principal problema do modelo de licenciamento ambiental no Brasil é que ainda se baseia totalmente em papel e o julgamento dos processos depende muito da subjetividade dos analistas. O processo em papel dá origem aos EIA-RIMAs, que geralmente são calhamaços, muitos feitos na base do “cola copia”, que ninguém lê, a não ser os analistas do órgão ambiental, que por força do dever têm que analisar os estudos e as listas de impactos ambientais que serão provocados pelos empreendimentos, bem como as mitigações propostas. Isso, na opinião da secretária, dá margem a absurdos. Ela cita o caso do EIA-Rima da usina de Belo Monte, que tinha um metro de altura, com milhares de páginas.

No modelo que ela denomina de mental, o poder público deixa para o empreendedor a tarefa de estudar o local do seu empreendimento, dizer como acontece a questão da biodiversidade, da fauna, da flora, da água, do clima, do vento, informar o que vai fazer e como pretende desenvolver a atividade, considerando todos esses elementos, da melhor forma e com o menor impacto possível, e que medidas pretende adotar para evitar degradação ambiental, poluição, perda de biodiversidade e tudo mais.

Para ela, em pleno século XXI, com os avanços da tecnologia da informação, isso é algo inconcebível. Por esta razão, no estado de Goiás ela já está pensando em começar a usar a Inteligência Artificial para analisar as informações dos pedidos de licenciamento, o que possibilitará uma grande agilização no processamento das informações e, consequentemente, na tramitação dos pedidos, além de permitir maior objetividade na análise das informações. Isto é importante, em sua opinião, já que a partir de 2010 o licenciamento ambiental, que antes focava os impactos nos meios físico e biótico, passou a incluir aspectos socioeconômicos. “E o licenciamento tem que levar em conta povos indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais, patrimônio cultural e paleontológico. Então, o licenciamento passou a envolver questões de religião, de culturas ancestrais e fazer o resgate do patrimônio cultural. Isso vai ganhando subjetividade”, observa Vulcanis.

Foi por essa razão que ela decidiu mudar o modelo de licenciamento em Goiás, usando a tecnologia. O modelo, denominado de IP, não tem termo de referência, mas apenas o Projeto Básico Ambiental, que é um substituto do EIA-Rima, já que este não pode ser eliminado, porque está na Constituição Federal. “O que fizemos? Dissemos para o empreendedor: “você vai implantar um posto de gasolina? Então vai nos entregar os documentos e nós já lhe damos a lista dos impactos que sabemos que você irá produzir e indicamos as condicionantes que terá de cumprir para executar o seu negócio. Já temos, dentro do sistema, toda a base de informação. Então, já sabemos se aquele posto de gasolina vai estar sobreposto com uma APP (Área de Preservação Permanente), ou com uma UC (Unidade de Conservação). Com isso, otimizamos a análise, para chegar, portanto, à concessão de uma licença muito mais facilmente, com menos burocracia e avançando, porque a tecnologia é atualizada todos os dias. Assim, é a tecnologia trazendo cada vez mais resultados. E isso deve aumentar. Recentemente, tivemos uma reunião com um representante do Google e chegamos à conclusão de que a Inteligência Artificial vai entrar muito rapidamente nos pedidos de licenciamento. A IA vai analisar o pedido de licenciamento e entregar a análise em 10 minutos. Vejam a que nível estamos chegando. Já estamos com um nível de tecnologia de século 22. E criamos a Licença por Adesão e Compromisso, a LAC. Porque a resolução do Conama dizia que os estados podiam, respeitando as questões locais, regulamentar o seu licenciamento. Nós decidimos mudar o modelo mental, com termo de referência, estudo, análise, tudo com EIA-RIMAs de mil páginas que o analista tem que ler, questionar, criticar e se posicionar. Como o analista é ser um humano, é inevitável que ele coloque os seus valores quando está analisando. Isso tinha que mudar. Por quê? Porque, passados 40 anos de licenciamento ambiental, nós já temos, dentro dos órgãos ambientais, um volume de conhecimento considerável para saber quais impactos ambientais as atividades produzem e como podemos mitigá-los. Quem não sabe como é que se mitiga a poeira que uma mineração produz? Todos os EIA-RIMAs, todos os estudos que são feitos, dizem a mesma coisa. E o que acontecia dentro do órgão ambiental? Não existia tecnologia da informação. Tudo estava no papel, então os dados não eram compartilhados e nem reproduzidos. Quando cheguei à secretaria de Goiás, em 2019, já estávamos na era da tecnologia. Então decidi que tínhamos de usar a tecnologia a nosso favor, mudar o modelo mental. E construímos o novo modelo”, argumenta.

Para Vulcanis, o licenciamento ambiental hoje tem blocos de problemas centrais. O primeiro diz respeito à qualidade do que entra no órgão ambiental. O segundo é o corpo técnico desses órgãos. “Este segundo bloco é um dos problemas, porque os analistas têm medo. Eles foram tão massacrados ao longo desse processo todo, com ameaças do Ministério Público de entrar com processo criminal, que na hora de analisar um pedido ele vai ser mais rigoroso, porque está com medo. O servidor público quer segurança. Por isso, em Goiás nós temos meta de produtividade, com um adicional do salário de 35% quando cumprem a produtividade”. O terceiro bloco é a quantidade de processos que entram nos órgãos ambientais, que é muito grande, comparativamente à estrutura existente nesses órgãos.

Com relação aos vetos no Projeto de Lei aprovado no congresso, Vulcanis aponta que o setor do agronegócio vai colapsar em 180 dias, que é o prazo de vacância da lei, já que não pode ter LAC para empreendimento de médio potencial poluidor. Segundo ela, na verdade o veto visa impedir a LAC para mineração de médio porte. “Mas a LAC não foi feita para empreendimentos que tenham muitas variáveis e sim para empreendimentos em que se controla todas as variáveis, que não é o caso da mineração, seja de pequeno, médio ou grande porte. A atividade tem muitas variáveis: depende do território, de onde vai acontecer, que substância vai ser minerada. Portanto, se derrubarem o veto, no estado de Goiás não vamos aplicar LAC para mineração de pequeno porte. É uma escolha do Estado. Por quê? Porque não é responsável se fazer o licenciamento assim. Não dá para permitir LAC em um empreendimento que tem muitas variáveis. A LAC não se presta para isso”, afirma,

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